Você não vai querer irritá-las.
Desde tempos antigos, os humanos sempre buscaram desculpas para justificar pequenos infortúnios, e as criaturas míticas frequentemente desempenharam o papel perfeito de bode expiatório. O leite azedou? Deve ter sido um brownie. Ferramentas desapareceram? Culpe os knockers. Todo o vinho sumiu? Com certeza os clurichauns invadiram a adega.
O folclore de diversas culturas ao redor do mundo nos apresenta uma infinidade de seres pequenos e parecidos com fadas. Eles transitam entre atos benevolentes e travessuras maldosas, sendo notoriamente fáceis de ofender. Então, da próxima vez que você quebrar um vaso ou perder suas chaves, conheça alguns desses travessos em miniatura que podem levar a culpa.
1. Os Brownies // Escócia e Inglaterra
Os brownies são pequenos espíritos geralmente benevolentes, com origem no folclore da Escócia e do norte da Inglaterra. Eles habitam as casas e se dedicam a tarefas domésticas úteis, como bater manteiga ou polir o chão. Normalmente, os brownies vestem trapos ou andam nus, e há histórias que afirmam que, se você oferecer roupas novas a um brownie, ele abandonará sua casa. Isso pode acontecer por dois motivos: ou porque ficaram satisfeitos com as roupas, ou porque se sentiram ofendidos com o presente.
No entanto, é preciso ter cuidado! Os brownies têm um temperamento sensível, e irritá-los pode transformar essas criaturas prestativas em verdadeiros pesadelos. Quando isso acontece, eles se tornam boggarts – versões malignas dos brownies. Como boggarts, eles quebram objetos, arremessam coisas pela casa e se tornam hóspedes extremamente indesejáveis.
2. Os Knockers da Cornualha e os Coblynau Galeses // Inglaterra e País de Gales
Os knockers são pequenas criaturas, geralmente benevolentes, conhecidas por habitarem as minas de estanho da Cornualha. Já os mineiros galeses acreditavam nos coblynau, seres semelhantes em comportamento. Esses mitos podem ter surgido dos sons misteriosos de batidas que os mineiros ouviam enquanto trabalhavam no subsolo, associando-os a essas figuras anãs que supostamente habitavam o mundo subterrâneo.
Muitos acreditavam que os knockers eram úteis, alertando os mineiros sobre veios ricos de minério ou perigos iminentes, como o risco de desabamentos. No entanto, assim como outras criaturas do folclore, eles também eram conhecidos por suas travessuras. Quando ferramentas desapareciam ou alguém se perdia nas minas, os knockers eram os principais culpados. Para apaziguá-los, os mineiros deixavam oferendas de comida no chão das minas e sempre falavam deles com respeito, evitando provocar sua ira.
Com a corrida do ouro na Califórnia, os mineiros da Cornualha, famosos por suas habilidades, foram muito procurados. Assim, a lenda dos knockers se espalhou pelos Estados Unidos, onde eles passaram a ser conhecidos como TommyKnockers.
3. Trow // Escócia
Os trow são descritos como pequenas criaturas de aparência feia e deformada, algumas vezes invisíveis aos olhos humanos. Durante a noite, acreditava-se que eles invadiam casas para se aquecerem ao redor do fogo, enquanto os moradores aterrorizados se escondiam em suas camas, esperando que fossem embora. No folclore, dizia-se que os trow habitavam antigos montes chamados howes, encontrados nas Ilhas Orkney e Shetland. Lá, viviam em lares subterrâneos luxuosos, onde organizavam festas e, ocasionalmente, sequestravam humanos azarados para tocar músicas intermináveis enquanto os trow dançavam a noite toda.
Esses pequenos travessos também eram culpados por estragar leite ou cerveja, ou fazer objetos desaparecerem. Contudo, a sorte podia sorrir para um humano que encontrasse algum objeto pertencente a um trow, pois acreditava-se que tal item conferia boa sorte ao seu novo dono.
4. Kobold // Alemanha
Os kobolds são goblins de orelhas pontudas encontrados no folclore alemão. Assim como os brownies, são espíritos domésticos que escolhem sua casa como lar. Trate um kobold com gentileza, e ele ajudará com as tarefas domésticas. Porém, irritá-lo (o que não é difícil, já que essas criaturas têm fama de serem facilmente ofendidas) fará com que ele comece a pregar peças – derrubando pessoas, escondendo objetos e causando problemas gerais.
Na mitologia alemã, existem três tipos de kobolds:
- Goblin doméstico, que vive dentro de casas;
- Kobold das minas, semelhante aos knockers da Cornualha;
- Kobold marítimo, que habita navios, ajudando ou causando transtornos dependendo de seu humor.
Devido à sua natureza imprevisível, os kobolds eram vistos como hóspedes indesejáveis ou até mesmo maus presságios. Não é surpresa, já que algumas lendas contam histórias de kobolds enfurecidos que cortavam o ajudante da cozinha em pedaços e o colocavam na panela!
5. Pixies // Inglaterra
Os pixies (ou piskys) são os travessos clássicos do folclore inglês. Mais frequentemente encontrados na região oeste da Inglaterra, como Devon e Cornualha, os pixies são descritos como pequenos espíritos que vestem cores naturais, como verde e marrom. Eles adoram pregar peças e causar pequenas confusões, sendo tradicionalmente culpados por incidentes como velas apagadas, sons misteriosos ou objetos perdidos.
Os pixies eram considerados um tormento para os viajantes, pois tinham o hábito de desorientar pessoas, deixando-as perdidas e confusas. Esse comportamento deu origem ao termo “pixie-led” ou “pixilated“, usado para descrever alguém confuso ou atordoado.
6. Leprechauns // Irlanda
Os leprechauns são, sem dúvida, as criaturas travessas mais famosas do folclore irlandês. Facilmente reconhecíveis por seus cabelos e barbas ruivas, ternos verdes impecáveis e charme irlandês, eles encantam e provocam curiosidade. O nome “leprechaun” provavelmente vem do antigo termo irlandês Lú Chorpain, que significa “corpo pequeno”, e está associado à palavra irlandesa para sapateiro (leath bhrógan), já que eles frequentemente são retratados como remendadores de sapatos. Em 2019, no entanto, um grupo de estudiosos sugeriu que a palavra pode ter origens latinas.
Histórias de leprechauns existem há séculos, muitas delas alimentadas por sua fama de esconderem lendários potes de ouro. Os contos geralmente exploram a ganância humana, que os leprechauns habilmente expõem. Um exemplo clássico narra como um homem captura um leprechaun e exige saber onde seu pote de ouro está enterrado. O leprechaun aponta uma árvore, e o homem marca o local com um lenço vermelho. Porém, ao retornar com uma pá, descobre que o astuto leprechaun amarrou lenços vermelhos em todas as árvores ao redor, protegendo seu tesouro.
7. Clurichauns // Irlanda
Os clurichauns, primos dos leprechauns, são igualmente pequenos, de cabelos ruivos e ternos elegantes. Contudo, enquanto os leprechauns são trabalhadores sapateiros, os clurichauns têm uma fama muito mais festiva e desordeira. Conhecidos como os “espíritos selvagens” do folclore irlandês, eles adoram se embriagar e são frequentemente encontrados em adegas de vinho.
Os clurichauns têm uma relação especial com os estoques de álcool. Se forem mantidos felizes, garantindo que as adegas estejam bem abastecidas, eles protegerão os barris de vinho contra vazamentos. Porém, se irritados, transformarão o vinho em um desastre: azedo ou completamente perdido.
Amantes de festas, os clurichauns adoram cantar canções folclóricas irlandesas após algumas doses, e há relatos de suas peripécias mais excêntricas, como cavalgar pelo interior da casa montados no cachorro de estimação. Charmoso ou caótico? Talvez os dois!
8. Duende // Espanha e América Latina
Os duendes são criaturas pequenas e parecidas com elfos, originárias do folclore ibérico, que mais tarde se difundiram para a América Central e do Sul. Uma característica marcante dos duendes é que eles não possuem polegares. Eles podem ser tanto bons quanto maus, mas todos têm em comum um gosto por travessuras e uma tendência a se vingar se forem ofendidos.
Em muitos países de língua espanhola, os pais usam histórias de duendes para assustar crianças desobedientes, advertindo que esses seres podem levá-las se não se comportarem. Como muitos goblins, os duendes gostam de se esconder em cantos escuros dos quartos ou debaixo das camas. E um aviso para quem dorme com os pés fora das cobertas: há lendas que dizem que eles podem, acidentalmente, arrancar dedos enquanto tentam aparar unhas descuidadas.
9. Dokkaebi // Coreia do Sul
Os dokkaebi são goblins coreanos que assumem diversas formas. De acordo com o folclore, eles surgem quando um objeto doméstico descartado, como uma vassoura ou uma colher de madeira, ganha vida ao adquirir um espírito. Visualmente, os dokkaebi são descritos como criaturas feias e parecidas com trolls, e alguns têm apenas uma perna.
Esses goblins adoram pregar peças nos humanos, muitas vezes persuadindo-os a realizar tarefas inúteis, como lutar durante a noite inteira. Além disso, eles possuem habilidades de metamorfose, e algumas histórias contam que se transformam em belas mulheres para seduzir homens ingênuos. Alguns dokkaebi carregam um porrete mágico que lhes permite invocar qualquer item que desejarem, mas tudo o que eles convocam desaparece misteriosamente de onde estava originalmente.
10. Tsukumogami // Japão
Assim como os dokkaebi coreanos, os tsukumogami japoneses são objetos domésticos possuídos. Segundo a tradição, qualquer ferramenta com mais de 100 anos pode adquirir uma alma e ganhar vida. Por isso, no Ano Novo japonês, é costume descartar ferramentas antigas. No entanto, esses objetos abandonados não ficam felizes por serem jogados fora após anos de serviço e, ressentidos, retornam para causar caos.
Os tsukumogami aparecem em várias formas, e muitas histórias relatam suas façanhas. Um exemplo assustador é o Boroboro-Ton, um futon velho e esfarrapado que ganha vida e tenta sufocar qualquer humano que ousar dormir sobre ele, envolvendo-o em seus trapos desgastados. Para evitar que objetos antigos se transformem em tsukumogami maliciosos, algumas pessoas os levam a templos para serem queimados, na esperança de que sigam pacificamente para a vida após a morte.
11. Lutins // França
Os lutins têm origem no folclore francês e se espalharam com os colonos franceses para lugares como Quebec e a região Cajun. Esses hobgoblins são conhecidos por causar conflitos e atrapalhar a vida dos humanos. Eles realizam travessuras típicas de fadas, como estragar alimentos e roubar objetos, mas possuem um talento especial: mexer com cabelos.
Lutins adoram criar nós no cabelo de cavalos ou pessoas e, às vezes, cortam os fios de humanos enquanto dormem. Alguns possuem objetos mágicos, como um chapéu que lhes concede o poder da invisibilidade, perfeito para suas brincadeiras. Mas nem tudo está perdido: um truque simples pode afastar um lutin. Basta espalhar sal, um recurso facilmente encontrado, para mantê-los longe.
Este artigo foi desenvolvido com base no conteúdo do site: https://www.mentalfloss.com/article/79913/11-miniature-mischief-makers-world-folklore
André Pimenta é um apaixonado por mitologia, folclore e histórias e estórias fantásticas. Contribuidor dedicado do Portal dos Mitos. Com uma abordagem detalhista, ele explora e compartilha os mistérios das lendas sobre seres e criaturas fantásticas do Brasil e do mundo.
